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segunda-feira, 16 de agosto de 2010

TARCÍSIO MEIRA CÉSAR

UM NOME QUASE ESQUECIDO
José Ozildo dos Santos

Tarcísio Meira César, indiscutivelmente, foi a mais poética de todas as personalidades patoenses. Lamentavelmente, duas décadas após sua morte, é um nome quase esquecido, apesar de alguém já ter dito que “sua obra tem uma qualidade real que lhe dá atualidade sem a tornar circunstancial”.
Nascido a 21 de junho de 1941, era filho do casal José César Cavalcanti e Maria Rita Meira César. Na cidade de Patos, fez seus primeiros estudos. Em 1955, foi aprovado no exame de admissão ao Ginásio Diocesano, concluindo o curso ginasial em finais de 1958.
Em princípios do ano seguinte, transferiu-se para o Recife. Na capital pernambucana, perfez o curso secundário no ‘Colégio Padre Félix’. Em seguida, aprovado no exame vestibular (1962), ingressou na Faculdade de Filosofia da UFPE, diplomando-se aos 17 de dezembro de 1964.
Esforçado, buscando sua independência financeira, Tarcísio Meira César antes mesmo de concluir seu curso superior, tornou-se professor de Língua Portuguesa e Literatura, na Faculdade onde estudava, funções que desempenhou no período de 1963 a 1964, quando passou à condição de professor substituto da cadeira de Metodologia e Técnica de Pesquisa Social (1965). Mais tarde, foi assistente do Catedrático Pessoa de Morais (1968), com quem nutria fortes laços de amizade.
Inteligência precoce, “pautou toda a sua curta existência por uma dedicação exclusiva à cultura”. Em 1964, iniciou sua militância no jornalismo, atuando como repórter do ‘Jornal do Commercio’ (do Recife). No ano seguinte, tornou-se redator/repórter especial do Diário de Pernambuco, passando a colaborar vários jornais e revista do país e do exterior.
Em 1965, no Instituto de Ciências do Homem da Faculdade de Filosofia/UFPE, em Recife, Tarcísio Meira César fez seu curso de Pós-Graduação. Nesse mesmo ano, tornou-se redator e editorialista do ‘Diário da Noite’, também editado na capital pernambucana.
Espírito culto, amante da poesia e dotado de profundos conhecimentos sobre os clássicos universais, ainda em 1959, ao lado de 13 outros jovens poetas paraibanos, participou da coletânea ‘Geração 59’, editada em João Pessoa, pela Secretaria de Educação e Cultura, cuja manifestação artística, constitui-se num “dos movimentos fundamentais da moderna produção literária paraibana”.
No Recife, por todo o ano de 1968, foi Oficial de Gabinete da Casa Civil, no Governo Nilo Coelho. Em princípios do ano seguinte, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde, através da Editora Leitura, publicou ‘Poemas da Terra Estranha’, seu primeiro livro, que foi posteriormente renegado, exceto, meia dúzia de poemas que foram republicados em ‘Poemas Grotescos e Outras Fantasias’ e ‘O Espelho Em Que Terminaras’. Esses livros, “reúnem composições poéticas em que o espírito da ‘Geração 59’ ainda se faz presente, com uso freqüente do soneto, mas em que aparece uma nova preocupação metopoética:‘coisa absurda é falar com a poesia / desnuda como o luar e bem mais bela; /como uma petulante caravela / sangrando mares de melancolia”.
No Rio de Janeiro, onde residiu por alguns anos, Tarcísio Meira César foi Assessor de Imprensa da Prefeitura daquela capital (1975-1979), durante a gestão do Dr. Marcos Tamoyo. Ali, foi repórter e redator de ‘O Globo’ (1972), da ‘Última Hora’ (1973), da Editora Abril; editor do ‘Diário de Noticias’ (1976); redator da Coluna Nacional de Heron Domingues (1971); colaborador da ‘Revista Leitura’ (1964-1975) e do ‘Correia da Manhã’ (1970), tendo ainda atuado no ‘Jornal Falado Perspectiva’ (1971) e sido redator do ‘Jornal do Rio’, ambos levados ao ar através da TV Tupi, Canal 6.
Em 1977, orientado pelos professores Mauro Mota e Sílvio Rabello, concluiu um de seus mais importantes estudos: ‘A Atuação da Mulher no Mercado de Trabalho’, que foi bastante aceito pela crítica da época. Redator da Imprensa Brasileira de Notícias (1979-1981), transferindo-se para a capital federal, tornou-se Professor substituto de Teoria Política I (1980), na Universidade de Brasília, onde também lecionou Introdução às Ciências Políticas (1981-1984).
Assessor de Imprensa da Secretária de Assistência Social do MPAS (1977), foi ainda Chefe do Serviço de Ensino à Distância da Universidade de Brasília (1982-1985) e Assessor Especial do Ministro da Educação Marcos Maciel (1986).
Cronista diário do ‘Jornal de Brasília’ (1983-1985), acumulou as referidas funções com o cargo de editor do suplemento Literário Gazeta. Ainda em 1983, Tarcísio Meira César publicou seu livro ‘Poemas Grotescos e Outras Fantasias’. No ano seguinte, tornou-se editor da Revista Humanidades (1984-1985). Seu último livro, ‘O Espelho em que terminas’, foi publicado pela ARX Editora Ltda/Brasília, em 1986.
Filósofo, ensaísta, jornalista e poeta, Tarcísio Meira César tinha em si ainda muito a oferecer. Mas, “os desígnios divinos determinaram que ele nos deixasse de maneira prematura”. Mergulhado num estado de inibição pavloviana, Tarcísio Meira César foi “um gênio que destruiu-se precocemente”, falecendo a 1º de janeiro de 1988, no Hospital Santa Lúcia, em Brasília-DF. Seu corpo, transladado para a cidade de Patos, foi sepultado no Cemitério São Miguel, no dia 3 seguinte.
Patrono da cadeira nº 9, do Instituto Histórico e Geográfico de Patos, em 1997, a Fundação Ernani Sátyro, enfeixou num único e valioso livro toda a sua produção poética, sob o título ‘Poesia Reunida’, volume que foi, então, largamente distribuído, e que, por sua vez, enriquece a bibliografia paraibana.
Num gesto valoroso e digno de registro, seus familiares doaram ao Instituto Histórico e Geográfico de Patos, todo o seu acervo cultural, composto por 1.263 livros, fotografias, cartas e documentos, que foi rigorosamente catalogado e instalado em sala própria. Por força da Resolução nº 04, de 21 de junho de 2002, a Biblioteca do IHGPatos passou a denominar-se ‘Tarcísio Meira César’.
Vate maior da capital das Espinharas, nele, na observação do crítico literário Pessoa de Barros, havia ”uma consciência de novos caminhos, como existe em poucos poetas do país”. Ao longo de sua curta existência, Tarcísio Meira César desenvolveu “uma rara experiência de artesanato literário”, mantendo-se ‘fiel ao seu tempo no tumulto de todas as inquietações, sofreguidão ou angústias de nossa época e, igualmente, ter condições interiores para os grandes reconhecimentos da aventura intelectual”.
Considerado em sua época “um caso admiravelmente raro no Brasil’, conhecia como poucos, um grande número de clássicos, revelando-se”um apaixonado pelo saber”. No Recife, o jovem e talentoso vate patoense, ao lado de valores como Glaudstone Vieira Belo, Valter da Rosa Borges, Sérgio Moacir de Albuquerque, Raimundo Carrero, José Mário Rodrigues, Marcos Santânder e do próprio Pessoa de Morais, teve uma atuação destacada nos meios literários pernambucanos.
A poesia residia em suas veias e como poeta, Tarcísio Meira César foi “o que se pode chamar um começo de conciliação entre tradicionais valores incisivamente únicos da poesia brasileira e as novas formas humanas de expressão correspondente às mudanças que se têm operando no país”.
Culto, possuidor de uma sensibilidade afetiva bastante acentuada, encontramos, pois, em sua poesia, fragmentos da mais pura e autêntica cultura nacional. Disciplinada, equilibrada e até certo ponto mágica, nela, o autor insere algo de seu ‘eu moderno’, numa experiência que combina o lírico com o social.
No poema ‘Os Poetas Ben(ditos)’, Tarcísio Meira César critica as correntes literárias do passado por criarem uma “simbologia desnecessária de um mundo agônico”. E, de forma ousada, convoca os poetas de sua época para que “carreguem seus sonetos / estrofes” e passem a viver longe das ilusões, seguindo seu exemplo; pois, ele próprio, já havia deixado “de ser um / poeta granfino / de fraque / e cartola / com se vê em fotografias / da bella époque”.
Se apenas houvesse escrito esse poema, Tarcísio Meira César seria para todos os fins, um poeta consagrado. Para ele, o verdadeiro poeta de vanguarda ‘encomenda’ seus próprios versos, “de acordo com a sua pessoa, estilo / e concepção do mundo e da / arte (...)”. E, num tom de alerta, afirmava que “o mundo anda com os pulmões pobres”, alimentados pelos vícios do progresso e danificados pelas guerras continuas, frutos da ignorância humana.
Como pessoa humana, Tarcísio definia-se como um ser “frágil, mas, apenas, na medida / da fragilidade atuante / que luta por escapar / de um vórtice voraz / que tudo engole e mal digere”. Em suas preces intimas, dizia: “Senhor, / uma nota qualquer à minha fé / é tudo o que preciso e quanto peço”.
Em raríssimos poetas paraibanos da atualidade, encontramos a eloqüência - qualidade viva em Tarcísio Meira César - que com desprendimento e naturalidade ‘construía’ seus versos. Sem alimentar o cansaço, ele passou pela vida de forma meteórica, deixando flores, sementes de seu talento, pelos caminhos que trilhou.
Poeta autêntico, não era preso a nenhuma escola literária e através de sua poesia, procurava sempre “retornar às puras e verdadeiras fontes do canto”. Ao publicar ‘Poemas Grotescos’, declarou: “meu único intuito ao divulgar estas composições, que denominei ‘Poemas Grotescos’, foi satisfazer as fantasias que durante toda a vida alimentei com relação à poesia, a qual, para mim à semelhança de Poe, não tem sido uma finalidade, mas uma verdadeira paixão”.
Tarcísio estreou como poeta e jornalista no Recife. E, por isso, é citado por alguns críticos e organismos da imprensa nacional como sendo pernambucano. Mas, mesmo distante do solo natal, ele carregava consigo a ‘Paisagem’ árida do sertão das Espinharas, assim, descrevendo-o: “Vegetação alguma havia lá. / Nem vento que agitasse o nada em torno. / Só um hálito antigo e muito morno / tangia a alma do tempo sem cessar”.
Em vida, foi ele um poeta que através do amor e de sua poesia pura, buscava a liberdade do viver e em sua própria observação, foi “um produto de seu tempo”. Possuidor de um estilo próprio, era isento de “pseudos regionalismos ou nacionalismos artificiais e outros ismos”, fazendo poesia “sem medo da rima, / sem medo do verso”.
Com seus ‘Poemas Grotescos’, Tarcísio Meira César foi bastante elogiado pela crítica da época, fazendo-se eterno e “nobre como o inverno”. Para ele, a poesia “tange os ventos e os navios / constrói a mais antiga madrugada. / Veste a noite de verde e inventa a amada / e as fadas que navegam por seus rios”.
Admirador declarado de Edgar Allan Poe, sua obra poética mereceu comentários elogiosos de nomes nacionalmente conhecidos, a exemplo de Jorge Amado, José Geraldo Vieira, José Condé, Otto Lara Resende, Gilberto Freire, Ivan Lins, Pessoa de Morais e Fábio Lucas. Sobre ele, disse Gilberto Freire: “jovem inteligente com superior vocação a crítica criadora”.
Pela temática e simplicidade de seus versos, Tarcísio Meira César é, indiscutivelmente, o maior poeta nascido na capital das Espinharas. Seu talento pode ser medido pelo ‘Soneto a si mesmo’, que foi a última peça poética da sua bela poesia, divulgada postumamente. Ei-lo, na íntegra:

“Descansaras, enfim, Tarcísio, só.
Morto nas tuas mãos o desengano.
Comediante irreal, caiu-te o pano
Que vai cobrir de escuro o próprio pó.

De nada valerão palavras vãs,
Amores fúteis, sonhos destroçados:
Teus olhos dormirão, já deslembrados
Das madrugadas, todas as manhãs.

As tuas noites, mortas, como queres,
Não mais doerão, extintas das vaidades,
Na ausência de todas as mulheres.

Não terás, quando a mágoa vier,
Molhada das mais rudes frialdades,
Turvar a flor que o corpo te colher”.

Como escritor e ensaísta, ele foi um dos melhores “da nova geração brasileira”. Experiente, polido e impulsionado por força própria, sabia “os caminhos poucos palmilhados das descobertas estéticas”.
Filósofo nato, Tarcísio Meira César desenvolveu toda a sua vida profissional e literária fora dos limites de sua província. Mas, mesmo assim, sua poesia não passou despercebida à apreciação dos grandes nomes das letras paraibanas, a exemplo do escritor e político José Américo de Almeida, que em carta ao poeta, emitiu o seguinte juízo: “Você extraí do vulgar uma novidade oculta que mais parece uma invenção, por ser atrativo. Eu estava com o propósito de nunca mais escrever a palavra ‘telúrico’, mas você é telúrico”.
“É óbvio - diz Perboyre Vasconcelos - que ninguém é entendido cem por cento”. Tarcísio Meira César não foge a essa regra. Precisa ser estudado para ser melhor compreendido e valorizado, dentro e fora de sua província. A cidade de Patos e a Paraíba perdem com o esquecimento ao qual, lentamente está sendo condenado o maior vate das Espinharas.
Em vida, esse ‘gênio das letras’ publicou apenas os livros já citados, mostrando-se poeta. Mas, grande parte de sua produção literária, encontra-se ainda dispersa em jornais e revistas, do Brasil e do exterior. São artigos filosóficos, contos, crônicas, ensaios e estudos, que merecem ser reunidos em preciosos volumes.
Como qualquer intelectual, Tarcísio Meira César cometeu equívocos e sua poesia não está isenta de erros nem de imperfeições. Por outro lado, é radiante, viva. Já disse alguém, que “há uma magia e um feitiço em todo bom poema”. E a poesia do talentoso vate patoense é só magia.
Hoje, Tarcísio Meira César é um nome quase esquecido na cidade que lhe serviu por berço. As gerações do presente precisam conhecer melhor esse ‘artista da rima’, que com seu poetar espontâneo e simples foi uma das maiores manifestações poéticas de sua época. Em resumo, é preciso preservar a memória desse ilustre patoense quase esquecido, dando-lhe o lugar merecido na cultura regional, pois, seu talento, agiganta as letras paraibanas.
Todo “poeta é sempre um ser especial”, “capaz de ouvir estrelas”. A exemplo de muitos outros amantes e cultores da poesia, Tarcísio Meira César andou “pela estrada da Vida Transitória, (...) de plaga em plaga, / mostrando o Luar, o Sol, a Flor, a Vaga, / formando assim o seu padrão de Glória”. Por fim, tombou “à lei fatal que rege o mundo”, deixando “a pulsar, grande, profundo”, seu “coração, em versos sobre a Terra”.
Artigo publicado no jornal ‘Folha Patoense’, Ano VIII, nº 45, Patos-PB, edição de fevereiro/março de 2004.

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